sexta-feira, 22 de junho de 2012

Há dois, somente dois e tão só!

Farei aqui um breve, brevíssimo pacto: eu direi que neste mundo há somente dois tipos de pessoas, e você, em resposta, concordará com um ligeiro aceno. Se é necessário? Como a terra o é para a semente. Pois bem, sobre a face sobranceira do mundo, conforme o combinado, há apenas dois tipos de pessoas: as que, ao correr, fazem "patchakabum ploft karabum" e as que fazem "tuc tuc... tuc tuc". As primeiras correm como se o próprio Xerxes fustigasse-lhes as costas e forçasse-os em obtusa marcha. As segundas correm, ao invés, leves e hábeis, como se um flautista acompanhasse-lhes o belo compasso. As primeiras sofrem e suam, as segundas parecem dançar.

Os primeiros são nossos escravos, seja por natureza ou por infortúnio. Os que são por natureza o são por vontade própria. Os que são por infortúnio o são contra sua vontade própria. De qualquer modo, um e outro correm desesperadamente e sem harmonia; não sabem que direção tomar nem qual ritmo devem seguir, apenas ouvem o zunir do chicote e os brados de seu senhor. Nada farão bem feito, mas atropeladamente e sem conhecimento, amontoando as ordens de má vontade e extasiados pelo medo. Entendem apenas uma linguagem: o que dói e o que não dói. Como o mortal que lhes açoita, obscuramente perecerão. São escravos como o ferro o é do ferreiro.

Os segundos são livres, e só o são por vontade própria, jamais por infortúnio. Tudo o que fizerem será bem feito, pois o fazem de livre vontade. Seu compasso será sempre belo, pois que suas pernas seguem o ritmo natural das coisas, e não o de outro qualquer. Não temem uns aos outros, porque que igualmente livres. Sua vontade busca naturalmente a harmonia e a perfeição, pois que não sujeita a outra vontade. Sabem que a única vontade bela é a que segue a vontade do que é primordial, e valorizarão sua liberdade. Não conhecem o desespero, pois sua vontade assenta-se sobre o eterno e não sobre a de um mortal. São livres como as montanhas e os regatos.

Agora, meu amigo, veja bem o que faz. Certamente não queremos ser escravos. Queremos ser belos, agir decentemente e fundar ao nosso redor delicados jardins. Nosso andar deve ser constante, suave, como um ritual. Às nações bárbaras, que ergam seus arranha-céus de ouro e aço, seus hotéis luxuosos e suas piscinas iluminadas. Que ululem e banqueteiem faustosamente. Convém-nos antes a liberdade doce, como o crescer lento das heras, da videira. O estardalhaço reservamos aos que sentem prazer em chicotear e em ser chicoteados. Nós, não. Nossa memória ecoará como sons de flauta e de cítara. Nossa imortalidade será como a neve, como o pinheiro.

2 comentários:

Anônimo disse...

Amei este texto!!! Concordo, sobretudo com a parte reservada "às nações bárbaras" (no final do texto).

Muita luz a você, meu caro.

Murilo Munoz disse...

;)